domingo, 22 de março de 2009

Toalha pouca é bobagem

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Eis um fato, doze entre dez casais (incluindo também aqueles dois vizinhos bisbilhoteiros) concordam que a toalha molhada em cima da cama é um vírus que mata a paciência pouco a pouco. Essa situação não era diferente na casa de Juliana e Rodrigo. Ela havia se controlado durante anos, tinha tido conversas, tinha tentado ser gentil, mas nada havia funcionado. Todos os dias o ritual era exatamente igual: Rodrigo chegava e arrumava milimetricamente os sapatos atrás da porta. Dentro do cesto de roupa suja colocava sem amarrotar a camisa que havia usado durante todo o dia, despia-se de forma com que nada ficasse fora do lugar, quando entrava no banheiro para o banho a casa estava impecável, como se homem algum tivesse passado por ali. O que vinha após o banho matava Juliana dia após dia.
Rodrigo saia do banho renovado, a cara mais corada, o corpo com um cheiro agradabilíssimo, e a toalha molhada... Em cima da cama. Do lado em que Juliana dormia. Juliana dormia no úmido, e sonhava os mais variados sonhos. Enforcar Rodrigo com a toalha molhada já era clichê.
À medida que o tempo ia passando, a paciência da moça ia se esgotando. Vivia num casamento perfeito, não era uma toalha que ia acabar com a felicidade digna de uma propaganda de margarina. Ocorrera uma idéia a Juliana.

- Juliana, cadê nossa cama?
A doce esposa entrava no quarto com um sorriso triunfal e postura digna de rainha enquanto degustava cada segundo em que Rodrigo segurava a toalha molhada, certamente procurando o seu habitual alvo.
Depois que Rodrigo saiu para o trabalho ela não teve dúvidas, se a toalha na cama era o problema, ou a toalha ou a cama deveriam ser banidas daquela casa... A cama perdeu, ela havia gastado muito tempo bordando “ele” e “ela” nas toalhas para que essas fossem atiradas ao lixo.
- A essa hora nossa cama deve estar esquentando a noite de algum mendigo, provavelmente virou uma bela fogueira, com colchão e tudo!
- Mas onde agente vai dormir?
- Você pode forrar no chão essa toalha que você usou pra se secar, mas do seu lado, por favor!
Juliana sabia que no outro dia Rodrigo compraria uma nova cama e aquilo seria motivo para muitas e muitas brigas, mas dormiu contente consigo mesma. E o melhor, seca!

Sobre a sinceridade masculina

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A humanidade busca incansavelmente a igualdade entre os sexos. Em termos, essa busca é de extrema importância, apesar de sexos diferentes as pessoas possuem a mesma essência, logo devem ter os mesmos direitos. É impossível, entretanto, dizer que homens e mulheres são (ou serão um dia) iguais.
Freud diz que num certo período da vida as meninas descobrem que falta algo nelas, se sentem castradas e a sociedade se encarrega de treiná-la para seu futuro brincando de casinha e cuidando de suas bonecas que são metáforas do que serão um dia seus filhos. Por outro lado, os meninos se vêem iguais ao pai quando descobrem o falo, daí em diante se sentem “o sexo forte” e passam a acreditar que sua missão é defender o sexo oposto. O sexo frágil.
Essa é a primeira de muitas burrices que o homem comete na vida.
A maior diferença entre os dois sexos é: as meninas crescem e se tornam mulheres, os meninos crescem e continuam sendo meninos. Para sempre.
Homens geralmente não se dão muito bem com sinceridade e quando se fala de relacionamentos amorosos a situação se torna apavorante. E o pior de tudo é saber que isso foge do assunto traição, homens não se dão bem em nenhuma parte do relacionamento onde se é necessária sinceridade. Um erro de programação no processo de criação do homem fez com que a regulagem da sinceridade fosse prejudicada. Homens são extremamente sinceros ou extremamente falsos. Sem meios-termos.
Se servir de dica, nunca peça para um homem ser sincero. Ele será.
- Nando, sabia que eu te amo?
- Ah! Que lindo... Obrigado!
Nando voltou ao Playstation como e nada tivesse acontecido.
- Você deveria dizer que também me ama!
- Mas lembra que você me pediu pra ser sincero?
- Então você não me ama? Quando você dizia que me amava não era sincero? VOCÊ JÁ ME DISSE ALGUMA COISA SINCERA FERNANDO?
Ele deu um pause e se demorou pensando.
- Bom, eu não menti quando disse que aquele seu vestido azul é lindo.
- Foi você que me deu ele de presente!
- É, eu tenho bom gosto. E isso também foi sincero.

As coisas são como devem ser e a natureza faz as coisas da melhor maneira possível, homens são assim, e nada mudará isso, é assim que deve ser. Nesse contexto podemos separar a raça homem em dois grandes grupos: os que sabem que não são sinceros mas não sabem lidar com isso, e os que sabem que não são sinceros mas aprenderam com o tempo a driblar essa deficiência com a falsidade ou o cinismo. Duas características extremamente masculinas.
- Fernando, você lembra aquela viagem pra Bonito?
- Lembro sim amor, lá é realmente bonito.
- E aquele carnaval em Salvador?
- Também amei essa, mas acho que o carnaval no Rio foi bem melhor. Belas noites lá!
- Eu nunca fui pro Rio.
- Nem eu – é nessas horas que a inteligência masculina funciona – Brincadeirinha. Mas vamos no próximo carnaval. Eu até já comprei as passagens. Era uma surpresa. SURPRESA!
Fernando teve que vender o Playstation no dia seguinte para comprar as passagens.

Existe um terceiro tipo de homem, mas esses são os impuros. Não se fala muito deles. É uma classe que tenta lutar contra a falta de sinceridade masculina. Tentam ser sinceros. Nunca funciona.
- Eu não quero mais ser seu namorado.
- O que? Me dê um bom motivo pra eu aceitar isso.
- Eu não te amo mais.
- Eu sei que você me ama. Eu vejo nos seus olhos.
O rapaz então fecha os olhos.
- E agora, estamos separados?
Depois daquela frase ele conseguiu abrir somente o olho esquerdo. O direito estava inchado, e doía. Aquilo ia precisar de gelo, sem dúvida.

Oficializar

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Bruna e Cláudio estavam na fase mais excitante do recente relacionamento, tinham paixão o suficiente para não conseguir parar os instintos carnais e segurança o suficiente para saber que não estariam separados no dia seguinte. A relação chegara a um novo nível.
Cláudio estava aflito quando tocou a campainha da casa de sua amada, havia tomado uma decisão, era chegada a hora de os dois tornarem-se um casal perante a sociedade. Pediria Bruna em namoro.
- Cláudio, você não disse que viria hoje – disse Bruna com o olhar apaixonado.
- Eu precisava falar com você...
- Parece ser algo importante.
- E é.
- Pois diga.
- Eu não sei bem como dizer, eu nunca fiz isso antes. Eu queria te pedir...
A essa altura os olhos de Bruna já lacrimejavam de tanto amor, ela sabia o que estava por vir.
- ... Pra ser minha namorada!
Bruna não conseguiu se controlar, abriu um largo sorriso e soltou um “sim” que pode ser ouvido pelos vizinhos. Cláudio estava nas nuvens.
- Então vou pra casa. Mudar meu status no Orkut!
- Vá logo meu amor.
Enquanto via Cláudio ficando cada vez mais longe, Bruna encostava-se ao batente da porta pedindo que o Google abençoasse esse novo namoro.

Finito

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Naquela noite Marcelo decidiu extravasar. Beberia qualquer coisa que fosse mais alcoólica do que cerveja, pois esta somente fazia cócegas no seu rim. Chegaria em casa e daquela noite em diante tudo seria diferente. Seu casamento havia chegado num ponto insustentável, era chegada a hora de dar um basta.

- Marcelo, você está bêbado!
Marcelo não se sentia bêbado. Talvez um pouco tonto, com enjôos e com coragem para mandar o patrão ir para o inferno, de onde nunca deveria ter saído.
Talvez estivesse um pouco alto, admitia.
Pensou uns instantes em como sua sogra era uma mulher amável.
Ok, ele estava completamente bêbado.

Durante o mês que estava terminando Marcelo refletiu muito sobre o real significado do casamento. Ouviu relatos de amigos, conversou com colegas de trabalho, se abriu com os familiares. Fez de tudo que podia, nada conseguia mudar a sua opinião. Não vivia num casamento de verdade.
- Eu quero me separar!
Camila começou instantaneamente a chorar.
- Você é louco! Louco e bêbado!
- Marcelo concordava com o “bêbado”. O “louco” era conseqüência.
- Camila, você percebeu quantas vezes brigamos nesse mês?
- Nenhuma!
- Isso mesmo! Quantos casais você conhece que não brigam?
- Nenhum!
- Viu? Nosso amor está fadado ao fracasso! Cedo ou tarde vamos nos cansar de todo esse amor e essa felicidade. E você sabe o que vai sobrar?
Camila se sentia confusa demais para responder.
- FILHOS! Que irão viver numa rotina sufocante cheia de amor e felicidade por todos os cômodos da casa.
- Isso não me parece ser tão...
- E nas reuniões da escola. Quantos alunos vão ter os dois pais do lado? Eu respondo: quase nenhum. Nossos filhos estarão na minoria oprimida! E nem vai ter lugar pra nós dois sentarmos... ONDE AGENTE VAI SENTAR CAMILA?
Camila soluçava e ia parando de chorar.
- É, acho que você tem certa razão. Essa coisa de família feliz é mentira. É como dizem, casamento é uma instituição falida.
Fez-se o silêncio. E ele dizia muito.
- Eu te amo Marcelinho.
- Eu também te amo Camilinha. Amanhã eu vou encontrar um advogado pra dar entrada nos papéis do divórcio.
- Agente se vê no tribunal amor.
Naquela noite ela dormiu na cama e ele no sofá. Apesar de todos os pesares, ele descansou a cabeça no travesseiro e dormiu com um sorriso estampado no rosto e uma conclusão estampada na cabeça: agora sim estava casado.

Dignidade feminina

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Há quem diga que o amor é cego, pois digo, ele não é. Na verdade o amor é burro e, em alguns casos, masoquista.
Numa dessas noites quentes, Joana demora mais do que habitualmente demoraria a chegar em casa. Seu marido a esperava sentado na cama do casal.
- Posso saber o porquê da demora?
- Claro meu amor. Foi o trânsito.
- Mas você nem trabalha de carro!
- Justamente por isso estou aqui, se viesse de carro ainda estaria presa no trânsito.
- O que?! Mas, que marca roxa é essa no seu pescoço?
- Lucio, você não vai acreditar. Entrei numa briga
- Você saiu na porrada? Com quem?
- Skinheads!
- Você brigou com uma gangue de skinheads?
Era demais para Lucio, levantou e começou a andar freneticamente pelo quarto. Joana parecia muito calma ao explicar os fatos.
- É lógico que não amorzinho! Eu não conseguiria.
- Mas...
- Foi um só! Mas foi horrível!
- E você sobreviveu?
- Logicamente meu querido, eu sou faixa rosa no judô.
- Não existe faixa rosa!
- Você já lutou judô?
- Não.
- Então me desculpe, mas você não sabe de nada!
- Você realmente acha que eu vou acreditar nessa história?!
- Eu é que pergunto meu amor! Você não vai acreditar que sua esposa faixa rosa no judô brigou com um skinhead?
- Não!
Joana começa a chorar teatralmente.
- Como você pode não acredita na sua esposa?
- Talvez seja melhor você não ser mais minha esposa. Eu quero divórcio!
Joana parou instantaneamente de chorar
- Ok!
- Só precisamos decidir como será feita a divisão dos bens.
- É simples! Metade pra cada um. Mas eu quero a metade maior!
- AHN?!
- Meu benzinho, foi você que pediu divórcio, vai ter que e dar pensão e tudo mais! Eu posso até alegar abandono de lar!
- Mas eu não abandonei o lar!
- Onde você esteve durante essa semana das oito da manhã até as seis da tarde?
- No trabalho!
- Se estivesse em casa isso tudo não estaria acontecendo. O nosso casamento fracassou e a culpa é sua!
- Parece que você queria que eu pedisse o divórcio!
- Claro que não. Eu estou arrasada!
Joana falava enquanto tirava as malas já feitas de dentro do armário.
- Eu amei nossos anos juntos meu querido. Você sabe o numero da minha conta, né? Se não depositar, vai preso!
Lúcio estava mudo.
- Já que estamos nessa onda de dizer a verdade, aproveito pra anunciar minha gravidez. Você vai ser papai ex-amor! Alguém vai ter que pagar pensão até o filhão fazer 21 anos! Foi um prazer benzinho, até a próxima.
Joana foi saindo com sua mala de rodinhas batendo em seu calcanhar. Da janela do quarto Lucio pôde ver Joana entrando no carro de um desconhecido.
Lucio teve a leve impressão de que estava sendo trocado por outro. Pelo menos Joana teve a dignidade de somente partir com outro depois de o casamento estar terminado.

Amor é bom porque é cego, se fosse surdo...

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- Amor, você prefere que tom de verde?
- O mais claro.
- Isso é azul, você nem olhou!
Com os olhos pregados o futebol, Marcos teve a leve impressão de que algo acontecia ao seu redor.
- Você nunca me ouve!
- Desculpe querida, você poderia repetir, eu não ouvi.
Ana jogou a palheta de cores no chão. Agora Marcos sabia o que estava acontecendo. Uma briga!
- Meu amor, me desculpa, mas é a final do campeonato!
- E essas são as cores pro quarto do nosso filho.
- Ele nem nasceu! FALTA... Alguns meses ainda! E quando nascer nem vai saber o que é verde ou azul
- Como você é insensível!
- Eu não sou insensí... GOOOOL!
Naquela noite Marcos dormiu no sofá.
E ele nem ao menos sabia por quê.
Não fazia diferença, seu time era campeão.


Os dias foram passando e Marcos notou algo estranho, um cômodo novo na casa.
Um cômodo bem decorado, bonito.
Um cômodo... Rosa.
- ROSA?
- Pensei que não fizesse diferença, o bebê nem vai saber qual a diferença de rosa, azul, verde, amarelo...
- Achei que agente fosse conversar sobre isso.
- Da última vez você estava muito ocupado. Mas podemos conversar agora. Eu acho que...
- Sabia que eu acho o rosa uma cor muito bonita.
Fim do assunto.

Amélia

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Amélia não tinha a menor vaidade. Amélia é que era mulher de verdade.
Roberto era casado com Amélia. Roberto é que era feliz de verdade.
Ele costumava chegar do trabalho sempre as oito da noite, mas se numa sexta-feira de calor decidisse chegar as quatro da manhã, Amélia não reclamaria.
Amélia nunca acordava Roberto de madrugada para reclamar dos seus roncos que mais pareciam o som de porcos agonizando para morrer. Amélia deixava Roberto em paz quando ele queria passar o domingo todo coçando suas partes íntimas e vendo futebol, ela nunca falava nada contra. E quando acontecia de colocar o copo de cerveja suado em cima da mesinha de centro da sala, ela nem saia gritando pela casa.
Amélia era rara. Não era do tipo que passava horas discutindo a relação, e se Roberto fizesse alguma reclamação, Amélia simplesmente não respondia.
Enquanto passava horas no bar, seus amigos sempre voltavam para o fatídico assunto: mulher fala demais. Reclama da roupa jogada no chão, reclama da toalha em cima da cama. E mesmo que se jogue a roupa em cima da cama e a toalha no chão, certamente suas esposas continuarão reclamando.
Roberto tinha um grande amigo chamado Bartolomeu. Este vivia reclamando que sua mulher gritava alto demais.
- Alzira nunca consegue gritar baixo. E se eu digo isso pra ela, ela berra mais ainda. Eu não consigo entender – dizia ele tristonho.
Roberto saia do bar com um sorriso de um marido satisfeito no rosto. Mesmo com bafo de bêbado, marcas de batom e cheiro de cigarro, Amélia certamente não diria um “a” sobre isso. Ele dormiria feliz, como dormiu durante todos esses anos.
Enquanto no silêncio de sua casa vestia o pijama, Roberto pensava “Que bom que Amélia não é como Alzira”
Roberto se deixou levar pelo calmo sono. Nunca se arrependeu de ter se casado com uma mulher muda.

Adamastor

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Adamastor era o tipo do homem que se escreve com “H” maiúsculo e com “n” no final, porque homem que é homem não precisa dessas frescuras de saber escrever direito. Adamastor odiava viadagem e não tinha amigos íntimos, porque isso é muita viadagem. Adamastor não comia mel, mascava a abelha. Adamastor era homem como não se faz hoje em dia, ele tinha as rédeas de seus relacionamentos.
- Vamos logo mulher, ta demorando demais.
- Minha roupa está boa?
Adamastor era homem, homem não sabe ser sutil.
- Quando você vestir eu respondo.
- Mas eu estou vestida!
- E cadê o resto?
- Você vive implicando com minhas roupas.
Adamastor era homem, homem não foge de brigas.
- E você vive seminua. Nós não vamos sair assim!
- OK!
Adamastor havia ganhado a briga, ele era macho, machos dominam as fêmeas. Mas não soube disfarçar a cara confusa que fez quando a fêmea em questão pegou o telefone e começou a discar. Adamastor era homem, homens não têm o raciocínio tão rápido.
- Oi Íris, vamos sair hoje?
O instinto macho que vinha de seus ancestrais fez Adamastor tomar o telefone e desligá-lo.
- Você ia ter coragem de sair sem mim?
- Ia não, vou!
Adamastor não conseguiu impedi-la de sair, homens não são bons com argumentos. Na verdade, Adamastor acha que usar palavras como “argumentos” é viadagem.
O que restou foi se jogar no sofá e discar pro amigo do futebol.
- Marquinhos, acho que ela não me ama.
Pôs-se a chorar
- Calma cara! Pô, você é homem, homens não choram.
Adamastor chorou.

Acredite no poder do branco

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Raquel esperava ansiosamente pela visita da garota que iria roubar o mais preciso bem que tinha. O filho. Passara o dia fazendo aquela macarronada com o molho que, como dizia seu filho “ninguém no mundo conseguia fazer igual”. Fez também o estrogonofe que, igualmente segundo seu filho, era o prato preferido na nova namorada. Acidentalmente deixou cair algumas colheres de sabão em pó no estrogonofe. Raquel lembrou que deveria avisar para que não comesse o estrogonofe. Lembrou também que se esqueceria de avisar isto para a garota. Acidentalmente, claro!

A mulher ouviu o minúsculo poodle latir alegremente, só latia daquele jeito quando ele chegava.
- Augusto, meu bebê!
A recepção foi maravilhosa, repleta de beijos, abraços, afagos, elogios e conversas calorosas. Durante esse tempo em que mãe e filho matavam a saudade, a garota encarava o poodle, que a encarava de volta. Ele não estava feliz.
Passados longos e constrangedores minutos, Augusto lembrou que havia uma mulher ao seu lado. Logicamente que não era sua mãe, Augusto acreditava na castidade de Raquel, ela não era mulher, era somente sua mamãe. Curiosamente, nem Augusto nem Raquel conheciam Freud.
- Mamãe, essa é Sofia. Minha namorada!
- Ah!
Na mente doentia de Raquel “ah” poderia assumir diversos significados. Cabe perfeitamente para esse momento: Então você é a vaquinha safada que quer roubar meu bebê!
Enquanto os homens (Augusto e o poodle) viam TV na sala, Sofia e Raquel conversavam amigavelmente na cozinha.
- Augustinho disse que você ama estrogonofe, fiz especialmente pra você
- Dona Raquel, nem precisava ter se incomodado!
- Precisava, precisava muito! Prove um pouco.
- Acho melhor esperar o Augusto.
- Menina, não seja bocó! Senão quando casar ele vai quere mandar em você! E de qualquer forma, estou tão insegura, nunca fiz estrogonofe. Prova, vai!
- Eu realmente acho melhor...
- PROVE!
Sofia se viu obrigada a provar. Provou generosas colheradas. E fez cara de quem amou.

Todos estavam confortavelmente acomodados nas cadeiras, prontos para o almoço quando teatralmente Raquel quebra o silêncio.
- PUUUTZ!
Como se não fosse suficientemente bizarro uma mulher de quase cinqüenta anos dizendo “putz”, ela continuou:
- Melhor não comer o estrogonofe.
- Porque mamãe? Está com uma cara ótima!
- Dona Raquel, eu não falei nada pra não te decepcionar, mas o gosto está meio estranho.
Sofia tomava bons goles de suco para aliviar o gosto de sabão.
-Pois é, acho que eu acabei derrubando uma coisinha que estava do lado da pia dentro do estrogonofe. Que descuido o meu!
- O que caiu no estrogonofe?
- Se eu disser, vocês vão rir muito de mim!
Eles riram educadamente.
- Talvez tenha caído uma colher de sabão em pó. Como eu sou desastrada!
Eles pararam de rir.
- COMO A SENHORA ME DEIXOU PROVAR ISSO?
- Mamãe, pelo amor de Deus, isso não é coisa que se faça!
- Calma crianças, vocês não tem senso de humor?
Eles não riram. Nem que educadamente.

Eles podiam gritar, xingar e chorar. Mas o mal feito já estava feito. O estômago de Sofia ia ficar três vezes mais branco do que com os sabões em pó comuns. Porque Raquel tinha classe. Usou sabão em pó com alvejante.
Agora Sofia tomava suco direto da jarra.
- Mãe, você não ter vergonha de ter dado comida com sabão pra minha namorada?
- Vergonha do sabão nem tanto, tenho mais vergonha de ter feito o suco com a água do cachorro.
Sofia cuspia.
- Brincadeirinha! Já vi que você é uma garotinha sem senso de humor. Eu sei que meu bebê não gosta disso. Cuidado mocinha!
Agora Sofia não cuspia mais o suco. Cuspia fogo!
- BRUXA VELHA!
Como num grotesco episódio de Maria do Bairro, Raquel pôs-se a chorar.
- Filinho amado, você do que “essa-mocinha-aí” me chamou?
- Ah mãe! Você pediu!
- Velha desgraçada!
- E você é uma vadiazinha que não merece nem as colheres de OMO que estão aí dentro!
- COLHERES? VOCÊ DISSE QUE TINHA UMA!
- Uma, ou duas, ou doze... Que diferença faz?
- HÁ HÁ! OK! Eu ia te dar um tapa, mas agora vou te dar doze, afinal, não faz diferença!
- Calminha aí garotinha infeliz. Você primeiro tem que ficar de molho por trinta minutos, depois começa a centrifugar! Como você é iniciante, decidi colocar a quantidade pra um ciclo suave!
Era uma piada.
Raquel riu.
Sofia voou em seu pescoço!
- Augusto meu mimo, ela vai me matar!
- Fique tranqüila que eu não vou te matar, mas você vai levar umas belas bofetadas, ah vai!
- CHEGA! VOCÊS DUAS, QUIETAS!
- Viu bebê, é isso que dá trazer qualquer uma pra conhecer mamãe. Nem sei o nome dessa trombadinha!
- Pra isso que servia o almoço, velha desgraçada. Pra nos conhecermos. E meu sobrenome é Gallo, se tanto te importa saber.
- Augustinho meu amor. Responda pra mamãe, quem é a mulher do galo?
- Ó céus. É a galinha!
- Achei seu sobrenome bastante apropriado querida.
- Pra mim chega! Augusto, você vem comigo?
- Claro amor!
Eles estavam prestes a tomar o caminho da rua quando Raquel deu a última cartada.
- Meu bebê, estou tendo um AVC, eu vejo a luz, papai veio me buscar. Socorre mamãe!
Augusto voltou para socorrer sua mãe e quando virou a cabeça para ver a porta já era tarde. Sofia já tinha ido. Raquel estava completamente realizada, era menos um obstáculo, seu preciso bebê era exclusividade dela novamente.
Raquel acreditava no poder do branco.

A cabeça de Paulo coça

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- Amor, agente precisa conversar. E é sério.
Paulo já estava acostumado com aquela frase. Conhecia Marta a cerca de 10 anos, tudo para ela era motivo para uma conversa muito séria. Desde a ameaça de uma Terceira Guerra Mundial até a extrema necessidade de comprar um novo sapato para combinar com aquela bolsa que lhe custou uma fortuna, tudo era de extrema importância. Marta era do tipo fútil, que não amadurecia, passasse o tempo que fosse, era sempre a mesma criança inconseqüente. Agora estavam casados, e apesar de ter escolhido uma mulher defeituosa Paulo estava feliz.
- Paulinho, tem alguma coisa acontecendo, uma coisa... Estranha.
- Você ta grávida?
- Não, na verdade eu acho que eu não te amo mais.
Paulo preferia a gravidez. Sem dúvida.
- Eu acho que, sei lá. Nosso casamento esfriou.
- Mas nós só temos um mês de casados.
Enquanto Marta jogava nele centenas de argumentos pouco convincentes, Paulo repassava rapidamente em sua mente todo o tempo que haviam passado juntos. Nada daquilo fazia o menor sentido, ele era um bom marido. Nunca teve reclamações sobre seu desempenho sexual, abria a porta do carro pra ela e, por vezes, até mandava flores e outros pequenos mimos. Paulo se casaria com ele mesmo, estava certo de que era um bom marido.
- Acho que falta algo no nosso relacionamento.
- Que tal um filho?
- Algo que precise de menos responsabilidade.
- Um cachorro!
- Pensei num amante.
- Amanhã eu compro o cachorro!
- Pense como seria bom ter mais alguém conosco... Na verdade, comigo. Porque você nunca vai conhecer o Raul.
- Raul? Quem é Raul?
- Estou totalmente a favor da coisa de comprar o cachorro!
Paulo dormiu com a sensação estranha de que algo estava acontecendo, ele não sabia exatamente o que era. Sua cabeça coçava. Coçava muito. Mais precisamente a testa.